Módulo 2: Literatura, linguagem e visualidade na educação de surdos (Livro Digital)

2.1 Literatura surda

A noção de literatura surda começou a circular em alguns países da Europa e nos Estados Unidos, principalmente onde havia escolas de surdos, que tiveram papel fundamental nessa construção histórica e cultural.

Bahan (2006) menciona registros da trajetória histórica da literatura surda, passando por internatos e escolas de surdos, nas quais os surdos mais velhos contavam histórias para os mais novos.

Era comum a imitação de professores ouvintes, dramatizações, principalmente de filmes de faroeste (western) ou de guerras, isso porque esses tipos de filme apresentavam uma maior riqueza de ações que poderiam ser identificadas e interpretadas visualmente. O que começava como uma reprodução do que era assistido em filmes, transformava-se gradativamente em criatividade.

As histórias se misturavam com a imaginação dos surdos, que enriqueciam-nas com suas próprias vivências e muito senso de humor, algo muito peculiar em meio às narrativas surdas até hoje, deixando-nos esse legado cultural tão importante de ser perpetuado através de nossa prática pedagógica.

Você sabia?

Há vídeos publicados no Youtube com cenas de faroeste protagonizadas por pessoas surdas em Língua de Sinais Americana (ASL)?

Alguns deles mostram a habilidade fascinante das pessoas surdas em utilizar recursos visuo-corpóreo-espaciais sem sinais. Observe o vídeo a seguir:

Mas, foi somente a partir de 1864, com o advento da fundação da Universidade Gallaudet (Gallaudet University, localizada em Washington D.C.), que acadêmicos e pesquisadores surdos construíram significados em torno da literatura surda, com o objetivo de difundir esse artefato cultural entre seus pares surdos e ouvintes, disponibilizando materiais em comunidades surdas, em encontros de surdos, escolas de surdos, associações, enfim.

Visto que a Universidade recebe acadêmicos do mundo todo, coube a eles o papel de agentes multiplicadores em suas comunidades de diferentes países. Levavam consigo livros, vídeos, fotos e tudo que pudesse ser usado como registro da cultura da literatura surda.

Para Karin Strobel (2008), pesquisadora surda e professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em sua obra "As imagens do outro sobre a cultura surda", a literatura surda é um dos artefatos culturais do povo surdo.

Nessa mesma obra a pesquisadora apresenta os conceitos de povo surdo e comunidade surda.

Povo surdo: comunidade composta por pessoas surdas, que compartilha dos mesmos interesses e modos de vida.

Comunidade surda: comunidade composta tanto por pessoas surdas, quanto por pessoas ouvintes, sejam ouvintes amigos, familiares ou profissionais da área de Libras que convivem com pessoas surdas.

Para Karnopp (2006), ao nos referirmos à "Literatura Surda", estamos tratando de textos literários produzidos por pessoas surdas em Língua de Sinais, direcionados aos surdos, em vista de preservar e fazer crescer a comunidade surda e seus traços culturais. Considera a literatura apresentada em ambas as modalidades: sinalizada e escrita de sinais, no caso, modalidade escrita da Libras, chamada de SignWriting.

Já para a pesquisadora Sutton-Spence (2021), a Literatura Surda é a Literatura em Libras. Mesmo que o texto não tenha origem em mãos surdas, tratando da vida e da cultura do povo surdo, sendo traduzida para Libras, faz parte da literatura surda, porque, segundo a pesquisadora, o que importa dentro dessa perspectiva é a língua de apresentação e o público-alvo.

Para saber mais sobre Literatura em Libras, conheça a obra de Rachel Sutton-Spence, publicada em 2021, pela Editora Arara Azul, e que está disponível para acesso gratuito.

Literatura em Libras