Módulo1: Ensino de Ciências Humanas na Educação Bilíngue de Surdos (Livro Digital)
2.3.1 Vídeos
Podemos pensar no uso de vídeos como base para uma infinidade de estratégias na educação bilíngue.
É muito comum, quando assumimos uma turma de surdos, sairmos desesperadamente em busca de vídeos em Libras que expliquem determinados conteúdos. Acabamos frustrados porque na maioria das vezes não encontramos materiais de qualidade ou que estejam de acordo com aquilo que estamos trabalhando no momento.
De fato, buscar vídeos em Libras é uma opção para muitos casos, porém, não é a única! Com o amplo acesso a telefones celulares com câmeras, tablets e outros dispositivos de gravação, ficou muito mais fácil e prático incluir essas tecnologias no dia a dia da educação de surdos.
Mas, calma! Também não vamos propor que você sempre elabore roteiros, traduza e edite os vídeos (é uma opção, mas não é a única!). Que tal gravar os alunos ou pedir que eles próprios se gravem sinalizando?
Por se tratar de uma língua espacial e visual, fundada no movimento e na expressão corporal, a dramaturgia pode ser um bom atalho para atingir o público surdo, ávido por se comunicar e se expressar corporalmente.
Ora, se a língua de sinais exige do surdo essa potência expressiva, por que não aliar o ensino de história e geografia a essa habilidade já tão desenvolvida ou ainda por se desenvolver no estudante surdo?
Mas, não basta apenas colocar os alunos para encenarem peças de teatro, pois isso não os vincularia necessariamente ao conhecimento histórico e muito menos poderia ser considerada uma proposta bilíngue, pois estaria explorando apenas uma língua, a língua de sinais.
Podemos organizar metodologicamente as práticas em torno de uma sequência didática que envolva o trabalho com a fonte histórica escrita, o contato com o texto escrito dos mitos ou das narrativas literárias, por exemplo. Mas somente entregar os textos escritos não é suficiente. É importante fazer a leitura em conjunto, com mediação na língua de sinais e a discussão dos significados atribuídos pela turma.
Também podem ser oferecidos materiais complementares, como livros, revistas e materiais didáticos visuais, que demonstram exemplos da cultura visual e da iconografia de cada sociedade em cada período histórico.
Quando a turma estiver suficientemente ciente dos conteúdos dos textos e suas relações com os contextos históricos estudados, podemos partir para a escrita do roteiro do vídeo de forma esquemática. Uma alternativa é escrever no quadro branco ou no caderno as partes importantes da narrativa e o que deverá ser encenado para que a história seja bem contada.
A seguir, vamos te mostrar, na prática, um exemplo de atividade desenvolvida pela professora Gabriele Vieira Neves, na Escola Municipal Helen Keller, uma escola bilíngue de surdos localizada na cidade de Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, com turmas de quinto ao nono ano do ensino fundamental, utilizando o recurso de produção de vídeos para explorar conceitos de ciências humanas.
Na prática
Nesta atividade, a professora trabalhou com duas modalidades de roteiros: os baseados nos mitos e os roteiros de autoria.
Os roteiros baseados nos mitos foram adaptações sinalizadas, seguindo os mesmos passos da narrativa original. Foi produzida a encenação do mito de Ísis e Osíris, da história das Mil e uma noites, do mito do Pomo da discórdia e da História da capoeira.
As histórias autorais foram embasadas na cultura e nas características históricas de cada sociedade que haviam sido estudadas previamente. Foi produzido o Ouro do faraó, uma história criada pela turma, onde os ladrões de tumba se envolvem em uma confusão assustadora ao tentarem roubar o ouro do faraó. Foram utilizados os elementos e estruturas das histórias egípcias, mas a partir de narrativas criadas pelos alunos, envolvendo um misto de mistério, terror e comédia. A descoberta do fogo também foi um vídeo sem roteiro original, no qual a própria turma foi desenvolvendo pequenas esquetes onde iam encenando suas aprendizagens.
Para a produção dos cenários e dos figurinos foram utilizados: material reciclável, papelão, pedaços de tecidos etc, a fim de reproduzir adereços e roupas semelhantes aos observados durante as pesquisas iconográficas. Essa parte da atividade permitia que até mesmo os estudantes com aquisição precária da Libras e da língua portuguesa pudessem contribuir com suas outras habilidades. Também eram momentos de grandes interações entre os alunos, discussões sobre as formas de construir os aparatos materiais, etc.
Figura 3 – Adereços, vestuários e cenários produzidos para as encenações
Fonte: Produzido pela autora (2025).
O momento da filmagem também era rico em trocas linguísticas e culturais. Para além da aprendizagem dos conteúdos, havia também o aprender a posicionar-se diante das câmeras, o encorajar-se a interpretar um personagem histórico ou mitológico, o participar de um trabalho coletivo.
A edição e legendagem dos vídeos foi realizada pela professora, com o auxílio de alunos. Após finalizado o trabalho, foi feita a socialização dos vídeos em sessões de cinema para todas as turmas, com direito aos erros de gravação e postagens nas redes sociais, enfim, o material foi colocado para circular. Também foram organizadas exposições das peças e adereços produzidos nas feiras de ciências e reuniões de pais.
Outro exemplo que podemos citar de uso de vídeos é o Projeto de Ensino de astronomia para surdos, realizado no IFSC - Câmpus Palhoça Bilíngue, que traz os próprios estudantes surdos como protagonistas do processo de ensino e aprendizagem.
As atividades foram realizadas com alunos surdos de ensino médio, mas podem ser adaptadas para turmas de ensino fundamental.
Saiba mais
Se você quiser assistir a outros vídeos do Projeto Astronomia, produzidos pelo Grupo de Estudos de Astronomia Bilíngue (GEAB), acesse o canal do projeto no YouTube.
Além disso, os vídeos podem ser utilizados como forma de registro de avaliação, de composição de glossários e sinalários, produção de quizzes e outras ferramentas digitais. Os vídeos podem também estar presentes vinculados aos materiais didáticos escritos por meio de QR Codes.
Veja um exemplo:

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