Livro 2 - Alfabetização e letramento de crianças surdas (Livro Digital)

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Course: Repositório Curso Alfabetização e Letramento de Crianças Surdas
Book: Livro 2 - Alfabetização e letramento de crianças surdas (Livro Digital)
Printed by: Guest user
Date: Wednesday, 17 July 2024, 4:31 PM

1. Alfabetização e letramento

Vamos iniciar este assunto com uma reflexão:

Você já parou para pensar como definiria Alfabetização e Letramento?

Você já se perguntou por que é preciso alfabetizar letrando?

Geralmente quando perguntamos para professores o que entendem por alfabetização e letramento, é comum que respondam assim: “Alfabetização é o conhecimento das letras. Letramento é saber juntar as letras em palavras e interpretar essas palavras. Letramento é entender o sentido das palavras”.

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E para você, o que é alfabetização e letramento?

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Bom, antes de estudarmos cada um desses conceitos, vamos falar um pouco sobre a origem da escrita.

1.1 A origem da escrita

A escrita surgiu há aproximadamente 4 mil anos na Mesopotâmia quando as relações comerciais e administrativas se intensificaram e não era mais possível contar apenas com a memória! A escrita foi a estratégia utilizada para registrar informações importantes. Naquela época, eram registrados símbolos ou desenhos que representavam sobre o que se falava.

Ainda hoje temos tipos de escrita que representam o significado daquilo que se fala. São os ideogramas japoneses.

Mas, como sabemos, essas formas de escrita não são as mesmas utilizadas para escrever aqui no Brasil, certo? Foram os fenícios que criaram um sistema de escrita que representa os sons da fala e não o significado do que se quer falar. As letras, portanto, representam os sons que temos em nossa fala, os fonemas.

É preciso dizer que quando falamos de alfabetização de crianças ouvintes, é dada ênfase ao som. Não se preocupe, vamos falar dessa questão ao longo do módulo.

Voltemos à famosa frase “alfabetizar letrando”. Acontece que para entender essa afirmativa, precisamos, em primeiro lugar, compreender os conceitos de alfabetização e de letramento para, a partir disso, relacioná-los.

Então vamos lá.

1.2 Conceitos básicos de alfabetização

Alfabetizar, em um sentido restrito, significa codificar e decodificar sinais linguísticos que se combinam para formar palavras e frases de uma determinada língua.

Ou seja, a alfabetização compreende o processo de reconhecer a conexão entre fonemas (sons) e grafemas (letras), para então passar a combiná-las com a intenção de formar as palavras da língua.

Isso quer dizer que para uma pessoa ser considerada alfabetizada, em um nível mais simplificado, ela deve dominar certas habilidades mecânicas, as quais podem ser desenvolvidas por meio de diferentes técnicas e que a farão capaz de ler e de escrever.

Porém, sabemos que a alfabetização é um processo bem mais complexo do que a simples codificação e decodificação de sinais linguísticos, pois é necessário passar por diferentes estágios que envolvem, por exemplo, desde a representação do som em grafemas como a representação de interlocutores que estão ausentes no discurso (Tfouni, 2006).

Utilizamos o Glossário CEALE (2023) para apresentar os conceitos de Fonema e Grafema.

 

Definição de Fonema:

Fonema é um som distintivo em uma língua. Na prática, isso quer dizer que, se esse som for trocado por outro em uma palavra, tem-se uma nova palavra, de sentido diferente. Podemos dizer que /f/, por exemplo, é um fonema porque, ao trocá-lo em uma palavra como /faka/ (faca) por /v/, tem-se outra palavra com outro sentido: /vaka/ (vaca).

Os fonemas compõem as sílabas e podem ser vogais – /a/, /e/, /i/ etc. – ou consonantes –/p/, /f/, /s/, /ʃ/ etc. Como se pode notar pelos exemplos dados, os fonemas são transcritos entre barras. Também, eles são representados com uma notação específica, o Alfabeto Internacional de Fonética (Martins apud CEALE, 2023).

Veja a definição completa de fonema: Definição de Fonema

 

Definição de grafema:

Grafema é um termo técnico que pretende dimensionar um caráter abstrato para as unidades escolhidas para grafar os sons (letras). Diferentes tipos de letras podem registrar um mesmo grafema. Por exemplo, existem várias formas de grafar a primeira letra do nosso alfabeto (A, a, A, a) - considerando aqui a variação apenas entre maiúscula e minúscula e entre uma forma de imprensa e uma forma supostamente manuscrita. Assim, a letra tem uma relação com a realidade gráfica enquanto o grafema tem uma natureza mais interpretativa (Carvalho apud CEALE, 2023).

Veja a definição completa de grafema:  Definição de Grafema

 

No quadro abaixo, você pode visualizar um exemplo de um fonema e alguns de seus grafemas.

Quadro 1 - Exemplo de fonema e grafemas

 

Note que a representação do som em grafemas é um processo mais ou menos complexo, já que não há uma paridade única para grafemas e sons, isto é, um único grafema pode representar diferentes sons da língua a depender da posição que ele ocupa dentro da palavra. Por exemplo, a letra L no português brasileiro pode representar o som característico do L, como em Lápis, mas também pode representar o som de U, quando aparece ao final dos vocábulos, como em Varal, conforme figura.

Figura 1 - Representação dos sons L e U

Fonte: Elaborado pelos autores

 

Perceba ainda que para uma criança ouvinte, em fase de alfabetização, isso se complexifica se levarmos em conta o contínuo da fala, já que o aprendiz precisará aprender que certas unidades de sentido podem ser formadas por mais de uma palavra, como por exemplo no par [1] “casas” e [2] “casas azuis”, em que o grafema S modifica sua representação do som do exemplo [1] para o exemplo [2], sendo S no primeiro e Z no segundo, devido à junção com a palavra seguinte.

O próprio conceito de palavra não é trivial, como talvez possamos imaginar enquanto adultos que já dominam a língua escrita, pois a criança precisará lidar com o conceito de fronteira vocabular, ou seja, a concretização de um final de palavra.

Esses exemplos nos mostram, portanto, que a alfabetização já é um processo complexo para aprendizes ouvintes sendo alfabetizados na sua língua materna. Mais adiante, discutiremos as implicações da alfabetização no caso dos surdos, que precisam dominar o código escrito de uma língua cuja relação para eles é de segunda língua e, mais que isso, sem o apoio da oralidade.

Saiba mais:

Se você quiser compreender melhor alguns conceitos trabalhados neste módulo, sugerimos o uso do Glossário CEALE, voltado para termos de Alfabetização, Leitura e Escrita para educadores.

Termos de Alfabetização, Leitura e Escrita para educadores

1.3 Letramento e a relação com a alfabetização

Pensemos agora no conceito de letramento e na sua relação com a alfabetização.

Conforme a professora Magda Soares (2000, 2008), uma das grandes pesquisadoras na área de alfabetização e letramento no Brasil, o termo letramento advém do termo em inglês “Literacy”, e foi cunhado nas pesquisas desenvolvidas no Brasil, nas áreas da educação e da linguística a partir dos anos 1980. O termo Literacy em inglês significa “o estado ou condição que assume aquele que aprende a ler e escrever” (Soares, 2000, p. 17).

 

Mas afinal o que é letramento?

Conforme Soares (2000), é preciso pensar no letramento vinculado à ideia de que a escrita está condicionada a questões culturais, sociais, políticas, econômicas, cognitivas e linguísticas. Ou seja, ninguém escreve/lê como um fim em si mesmo. Nós, enquanto sujeitos inseridos em uma sociedade, escrevemos/lemos em determinados contextos de uso da língua escrita.

Isso significa que podemos definir letramento como um conjunto de práticas sociais que envolvem a leitura e a escrita para suprir necessidades sociais do indivíduo.

Nesse sentido, podemos dizer também que um sujeito letrado é aquele que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, e responde de forma adequada às demandas sociais de leitura e de escrita, utilizando dos mais variados tipos/gêneros textuais. Por exemplo, ler/responder um e-mail, preencher um formulário, ler/escrever uma receita de bolo, ler/responder questões de uma prova etc.

 

Fonte: Freepik

Aqui você pode estar se perguntando:

O que diferencia o conceito de alfabetização do conceito de letramento e qual a relação entre eles?

A alfabetização está relacionada ao desenvolvimento de habilidades mecânicas por meio de técnicas específicas, uma vez que, como vimos, aciona saberes complexos. Desse modo, quem é capaz de ler e escrever é alfabetizado.

Já o conceito de letramento está relacionado ao conceito de “práticas sociais” associadas ao uso da língua escrita; ou seja, à capacidade que um indivíduo tem de desenvolver suas habilidades de uso do sistema de escrita em atividades de leitura e de escrita situadas em práticas sociais que utilizam a língua escrita.

Logo, o que distingue os termos alfabetização e letramento é o conceito de práticas sociais. Essa discussão dá início, portanto, à ideia da alfabetização na perspectiva do letramento, pois a finalidade última da alfabetização deve ser instrumentalizar o indivíduo para os usos adequados da língua escrita em práticas sociais que envolvem a leitura e a escrita.

Fonte: adaptado de Soares (2022, p. 27)

Veja abaixo, de forma mais clara, a definição de alfabetização e de letramento, de acordo com Soares (2022, p.27):

Alfabetização

Processo de apropriação da “tecnologia da escrita”, isto é, do conjunto de técnicas – procedimentos, habilidades – necessárias para a prática da leitura e da escrita: domínio do sistema de representação que é a escrita alfabética e das normas ortográficas; habilidades motoras de uso de instrumentos de escrita (lápis, caneta, borracha…); aquisição de modos de escrever e de modos de ler – aprendizagem de uma certa postura corporal adequada para escrever ou para ler; habilidades de escrever ou ler, seguindo convenções da escrita, tais como: a direção correta da escrita na página (de cima para baixo, da esquerda para a direita); a organização espacial do texto na página; a manipulação correta e adequada dos suportes em que se escreve e nos quais se lê – livro, revista, jornal, papel etc.

Letramento

Capacidades de uso da escrita para inserir-se nas práticas sociais e pessoais que envolvem a língua escrita, o que implica habilidades várias, tais como: capacidade de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos – para informar ou informar-se, para interagir com outros, para imergir no imaginário, no estético, para ampliar conhecimentos, para seduzir ou induzir, para divertir-se, para orientar-se, para dar apoio à memória etc.; habilidades de interpretar e produzir diferentes tipos e gêneros de textos; habilidade de orientar-se pelas convenções de leitura que marcam o texto ou de lançar mão dessas convenções, ao escrever; atitudes de inserção efetiva no mundo da escrita, tendo interesse e prazer em ler e escrever, sabendo utilizar a escrita para encontrar ou fornecer informações e conhecimentos, escrevendo ou lendo de forma diferenciada segundo as circunstâncias, os objetivos, o interlocutor.

Repare que essa abordagem tem um efeito importante na escolha dos gêneros textuais/discursivos utilizados no processo de alfabetização, pois estes precisam ser representativos das práticas sociais de usos da leitura e escrita dos aprendizes.

Saiba mais:

Gêneros textuais do discurso são unidades formadoras de sentido com propósitos e intencionalidades discursivas específicas, que podem ocupar a esfera da oralidade e a esfera da escrita.

Gêneros e Tipos Textuais

Sumarizando, podemos dizer então que a alfabetização é a aquisição do sistema convencional da escrita, enquanto o letramento é o desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e de escrita nas práticas sociais que envolvem a língua escrita.

Esperamos que até aqui você tenha entendido o que significa alfabetizar letrando. Que tal compartilhar suas ideias com os colegas?

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Você compreendeu o que significa alfabetizar letrando?

Quais são as principais diferenças entre alfabetização e letramento?

Os conceitos que você expressou lá no início do capítulo permanecem ou modificaram?

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A seguir, vamos continuar abordando o processo de letramento.

1.4 O processo de letramento

É importante compreender que o letramento é um processo contínuo de desenvolvimento da linguagem; ou seja, não existe um indivíduo totalmente letrado, uma vez que este conceito está relacionado às práticas sociais de leitura e de escrita e às necessidades e exigências tanto sociais como de cada indivíduo no seu meio social.

Na prática:

Vejamos um exemplo para deixar isso mais claro: com o advento das redes sociais, novas práticas sociais surgiram, as quais exigiram o uso de novos gêneros textuais/discursivos, justamente para dar conta de determinadas necessidades sociais. Assim, nós, como indivíduos em processo de letramento, somos movidos, por exemplo, a desenvolver nossas habilidades de leitura e de escrita em posts do facebook, do instagram e em mensagens de aplicativos de conversa. Perceba que isso ocorre nas mais variadas esferas de uso da língua, desde as comunicações pessoais até contextos de textos instrucionais bem como nos usos acadêmicos da língua escrita.

Perceba, portanto, que quando falamos de Letramento, estamos falando de graus ou níveis de Letramento, justamente porque este conceito está relacionado com os usos sociais que fazemos da língua. Estamos diante, portanto, de um processo contínuo de desenvolvimento da linguagem, cujos diferentes tipos e graus de letramento vinculam-se às necessidades e exigências sociais e individuais.

Podemos ter, por exemplo, um sujeito minimamente letrado, que sabe identificar o valor do dinheiro, identifica o ônibus que vai tomar e consegue fazer cálculos e ler textos menos complexos, como bilhetes, mas não tem o hábito da leitura de jornais. Por outro lado, encontramos sujeitos com maior nível de letramento e uma apropriação mais efetiva da escrita, como é o caso de alguém que escreve romances ou textos acadêmicos de determinada área do conhecimento (Marcurschi, 2008).

Sendo assim, alfabetizar letrando significa pensar nos usos sociais de leitura e de escrita envolvidas no processo de alfabetização numa perspectiva de língua como um fenômeno social que leva em conta as relações entre língua, cultura e sociedade, pois a função última de aprender a ler e escrever é justamente interagir socialmente dentro de determinados contextos de uso da língua escrita.

1.5 Aspectos linguísticos e o processo de alfabetização

Do ponto de vista linguístico, Massini-Cagliari (2001) discute quatro aspectos que precisam ser levados em consideração no processo de alfabetização. São eles:

  • a diferença entre desenho e escrita,
  • a relação entre os sons e as letras,
  • a categorização gráfica e funcional das letras e
  • a segmentação da fala e da escrita.

Pensemos agora sobre cada um deles.

1.5.1 Diferença entre desenho e escrita

O primeiro aspecto que a criança precisa perceber, durante o processo de alfabetização, é o que diferencia o desenho da escrita. Em primeiro lugar porque, sob certo ponto de vista, as letras são desenhadas. Porém, dentro de um sistema de escrita, as letras representam muito mais do que um simples desenho.

A diferença fundamental entre escrita e desenho é que, enquanto este último, assim como a fotografia e as figuras, representa o mundo de forma direta, a escrita representa a fala/linguagem, que por sua vez representa o mundo, conforme mostra a figura abaixo:

Figura 2 - Representação do mundo pela linguagem

Fonte: Adaptado de Massini-Cagliari (2001, p. 12)

Talvez você possa estar se perguntando: por que essa diferença é relevante no processo de alfabetização?

Porque, conforme a autora, nos deparamos no dia a dia com desenhos e figuras que ora são utilizados como tal, ora são utilizados como escrita. É só pensarmos nos emojis tão comuns nos aplicativos de conversas. Eles podem simplesmente representar um objeto no mundo, sendo utilizados como imagem, mas também podem ser utilizados como escrita, representando a linguagem, que por sua vez representa o mundo.

E como podemos diferenciar um uso do outro?

Massini-Cagliari explica que quando um desenho é utilizado juntamente com outras formas de escrita, gerando textos, estamos diante de uma escrita que pode ser considerada ideográfica, ou seja, aquela em que a decifração parte da IDEIA expressa pela escrita.

 

A autora alerta que como as letras também são desenhos, as quais possuem traços gráficos que as distinguem umas das outras, tendo a função específica de representar a linguagem por meio dos sons, é imprescindível que a criança perceba as diferenças entre desenho e escrita justamente nesse aspecto: que as letras não são apenas um desenho, mas representam uma unidade distintiva na língua, possuindo aspectos gráficos que as diferenciam entre si. Por exemplo, as letras b, d e p diferenciam-se, neste estilo gráfico, de acordo com suas posições em relação umas às outras.

1.5.2 Relação entre os sons e as letras

Referente ao segundo aspecto, da relação entre os sons e as letras, repare que: no que diz respeito à alfabetização de crianças surdas e de crianças ouvintes, enquanto para as ouvintes é necessário enfatizar as correspondências entre sons e letras, para as crianças surdas essa distinção não fará sentido.

Nesse ponto, precisamos falar do papel da ortografia no processo de alfabetização. Em termos gerais, a ortografia é uma forma de neutralizar a variação linguística, escolhendo uma forma de escrita ortográfica para a palavra. Por exemplo, a palavra balde pode ser pronunciada de diferentes formas, a depender do dialeto em questão. Porém, para normatizar a língua escrita, elege-se uma (ou mais de uma) forma para representar todas as variações dialetais.

A palavra pote, por exemplo, pode ser pronunciada de várias maneiras, como pote, potch, potchi, poti etc., mas uma delas será a forma ortográfica normatizada. É importante destacar que essa forma escolhida pode representar a fala de parte da população ou mesmo de ninguém, como é o caso da palavra muito, pronunciada com nasalização em qualquer variedade do português brasileiro (algo semelhante a muiNto – tente pronunciar sem a nasalização e sinta como soa “estranho”).

 

Mas qual a relação entre a ortografia e a alfabetização

No caso das crianças ouvintes, o processo de alfabetização parte da oralidade; ou seja, as crianças tendem, nas suas primeiras incursões na escrita, a escreverem como falam. Já as crianças surdas, que não se apoiam na oralidade, terão contato direto com as formas ortográficas das palavras. Essa distinção certamente terá impacto em metodologias diferenciadas para alfabetização de crianças surdas (experiência visual da palavra) e de crianças ouvintes (experiência que parte da oralidade).

1.5.3 Categorização gráfica e funcional das letras

Vejamos agora o terceiro aspecto, que trata da categorização gráfica e funcional das letras.

A categorização gráfica tem a ver com agrupar em um único rótulo uma unidade na variedade das formas gráficas de determinada letra. Um exemplo disso são as variedades de formas gráficas em diferentes estilos (A, a, a, A ...) que são chamados pelo rótulo “A”. Isso quer dizer que há uma noção abstrata de “LETRA” a qual nos permite interpretarmos como a mesma letra suas formas distintas de representação gráfica na escrita (Cagliari, 2001).

Já a categorização funcional das letras diz respeito às relações entre sons e letras e vice-versa. Essa relação, de modo geral, parte do princípio acrofônico que estabelece o valor de cada letra, ou seja, cada letra possui um nome o qual representa um dos sons que essa letra poderá ter dentro do sistema de escrita da língua. Por exemplo, a letra S, que se chama “esse”, representa na língua portuguesa o som de S, mas também pode representar o som de Z. E o que vai determinar o valor de cada letra no sistema de escrita será justamente a ortografia.

Os autores chamam a atenção para o fato de que a criança ouvinte em fase de alfabetização precisa compreender ambas as categorizações, ou seja, entender que a letra pode apresentar variações gráficas de estilo e entender que a mesma letra pode representar mais de um som e também que o mesmo som pode representar mais de uma letra. No caso das crianças surdas, a categorização gráfica terá um impacto visual importante que precisa ser levado em consideração.

1.5.4 Segmentação da fala e da escrita

O último aspecto linguístico apontado por Massini-Cagliari (2001) trata da segmentação da fala no processo de alfabetização. Essa questão impacta sobremaneira as crianças ouvintes porque a fala é um continuum, ou seja, não separamos as palavras umas das outras ao falar.

No entanto, a representação gráfica da linguagem vai colocar espaços entre uma palavra e outra, exatamente como você está vendo nesse texto que lê nesse exato momento. Essa característica será um desafio para crianças ouvintes, por isso é muito comum, no início da alfabetização, encontrar palavras conectadas como “conlicença” “tenque”.

 

Nesse processo, as crianças buscarão estratégias na própria língua e em seu uso para conseguir realizar a segmentação das palavras esperada na escrita. Por outro lado, as crianças surdas, como não se baseiam na oralidade para lidar com os aspectos da escrita, já terão contato com a segmentação das palavras na língua escrita.

Até aqui você deve ter percebido que há pontos comuns e pontos divergentes nos processos de alfabetização de crianças surdas e de crianças ouvintes. Isso porque surdos partem da experiência visual, enquanto os ouvintes partem da oralidade. A partir dessas constatações, portanto, é imprescindível que pensemos em metodologias adequadas para a realidade visual dos surdos, começando com a importância da língua de sinais nesse processo.

1.6 Fases da escrita

Emília Ferreiro e Ana Teberoski realizaram pesquisas na área da alfabetização na década de 1970, que culminou com a publicação da obra Psicogênese da Língua Escrita em 1979. Elas observaram que as crianças formam hipóteses sobre a escrita, bem como passam por diferentes fases até se apropriarem das regras ortográficas.

Você se lembra da teoria da epistemologia genética, de Jean Piaget, que estudamos no Módulo 1? As autoras mencionadas seguem tal abordagem teórica para orientar as suas pesquisas.

Para a psicogênese da língua escrita, o contato da criança com tentativas de registro leva a uma situação de conflito, um desequilíbrio, fazendo com que a criança crie hipóteses. Os esquemas assimilativos determinam, entre outras coisas, que não se pode escrever com apenas uma letra e que são necessárias letras diferentes para escrever. As crianças também imaginam que para escrever o nome de algo pequeno, poucas letras são suficientes, e se quer escrever o nome de um objeto grande são necessárias várias letras.

Durante o processo de alfabetização é muito importante que nós conheçamos as hipóteses que as crianças elaboram para podermos ajudá-las a aprender. Talvez fique mais fácil compreender esse processo de alfabetização acompanhando a figura abaixo:

Figura 3 - ciclo de alfabetização e letramento

Fonte: adaptado de Soares (2022, p. 137)

Na primeira fase de registro da língua as crianças utilizam o desenho para fazer a representação. Após observar a forma como os adultos escrevem, as crianças passam a fazer linhas bastante tortuosas tentando reproduzir essa maneira de registro. Chamamos essas linhas de garatujas.

Em seguida, a criança percebe que devemos usar as letras para escrever, porém, ela ainda não se dá conta da relação entre os grafemas e os sons, e usa letras aleatórias em sequência para escrever. A garatuja e a escrita com letras fazem parte da fase pré-fonológica, portanto.

E como a criança faz a transição da garatuja para as letras?

Tendo contato com a escrita nos mais variados gêneros textuais que estão à nossa volta! Um exemplo bem comum são os livros de histórias infantis.

Na imagem abaixo é possível ver que a criança, de 4 anos e 3 meses, mistura a garatuja com as letras nessa produção espontânea, sem orientações de um adulto:

Figura 4 - Carta ao Papai Noel

Fonte: Arquivo pessoal dos autores.

Nas fases seguintes, a criança começa a desenvolver a consciência silábica e passa pelas fases silábica sem valor sonoro e silábica com valor sonoro. Nesta etapa, a criança já tem a noção de que a quantidade de letras utilizada para escrever tem a ver com a quantidade de vezes que ela abre a boca para pronunciar cada sílaba. A diferença é que na fase silábica sem valor sonoro a criança escolhe as letras para representar cada sílaba da palavra sem fazer relação com o som que elas têm, enquanto que na fase silábica com valor sonoro a criança escolhe uma letra representante de cada sílaba que tem relação com o som. Basicamente, ela escolhe ou uma consoante ou uma vogal, mas não a sílaba completa.

Na fase silábico-alfabética há uma variação: algumas sílabas são escritas de maneira completa (consoante e vogal) e outras constando apenas a consoante ou a vogal que faz parte da sílaba.

A diferença entre as fases alfabética e ortográfica é que na primeira a escrita ainda sofre muita influência dos sons ou fonemas, levando a criança a trocar o S pelo C, o S pelo Z, por exemplo. Já na fase ortográfica as regras de escrita começam a se consolidar e as influências do som que causam erros na escrita diminuem até desaparecer.

Na prática, em uma mesma turma as crianças estão em diferentes fases de aquisição da língua escrita.

E o que nós professores podemos fazer para colaborar com a aprendizagem de todas?

Devemos começar identificando qual nível cada criança se encontra, ou seja, o que ela já sabe da escrita. Para Vigotski partir desse conhecimento que a criança traz é considerar a sua zona de desenvolvimento real. A partir do que ela já conhece, oferecemos oportunidades de construção de novos conhecimentos, a fim de que ela avance em seu processo de aprendizagem.

Você deve estar se perguntando: o que fazer depois de constatar que os alunos não estão no mesmo nível de aquisição?

 

A própria Soares (2022) chama a nossa atenção para a importância do uso dos textos na alfabetização. Textos da vida real, como já discutimos anteriormente. Então, utilizando diferentes gêneros, em torno da mesma temática, é possível proporcionar à criança que ela observe a grafia de uma mesma palavra diversas vezes, em diferentes materiais e assim caminhe para a escrita ortográfica.

2. O processo de apropriação da leitura e da escrita pelos surdos

Se você é ouvinte e deseja compreender o processo de apropriação da leitura e da escrita pelos estudantes surdos, é necessário, primeiramente, deixar de lado a sua própria experiência de aprendizagem de leitura e escrita e ter bem claro em sua mente que o estudante surdo não é uma criança ouvinte que não ouve.

Desse modo, as representações que você construiu acerca desse processo, até agora, foram baseadas fundamentalmente na memória de suas experiências de aprendizagem de leitura e de escrita na escola e/ou em casa e do uso social que você fez e faz delas na escola e fora dela. Isto é, as experiências de alguém que ouve e se vale da via fonológica para compreender e produzir textos. Nessa empreitada, você também não pode esquecer que você, ouvinte, aprendeu a ler e a escrever a mesma língua que você já falava.

Em outras palavras, como argumenta Vanbrugghe (2013, p. 166), você desconhece ou conhece pouco “[...] as consequências de uma construção linguageira, fundada na exploração das potencialidades visuogestuais”.

 

 

Esse aspecto é essencial para pensar modelos de alfabetização e letramento de crianças surdas, bem como o ensino de Português como segunda língua para surdos ao longo dos anos da Educação Básica, sobretudo, porque, no Brasil, ainda não há clareza suficiente sobre o modelo científico, educativo e pedagógico da leitura e da escrita no contexto da surdez.

A partir de agora, você vai conhecer um pouco mais sobre as especificidades dos processos envolvidos na apropriação da leitura-escrita pelo aprendente[1] surdo.

Vamos iniciar com uma reflexão acerca do papel da primeira língua de sinais nesse processo. Em seguida, vamos explorar um pouco os processos cognitivos implicados na apropriação da leitura-escrita. Por fim, discutiremos acerca da noção de “interlíngua” no processo de apropriação de uma segunda língua pelo aprendente surdo.


[1] O conceito de “aprendente” nos permite englobar em nossa discussão todo o público em situação de aprendizagem de línguas-culturas que os termos “aluno” ou “estudante” não contemplam. Além disso, a noção de “aprendente”, segundo Puren (1995, p. 129), afirma, pela forma ativa do adjetivo verbal, a concepção de aprendizagem como atividade pessoal do sujeito aprendente.

2.1 O papel da primeira língua de sinais no processo de apropriação da leitura-escrita pelos aprendentes surdos

O processo de apropriação da leitura-escrita pressupõe o desenvolvimento prévio de algumas competências que vão incidir diretamente sobre as habilidades do aprendente leitor-escritor surdo para compreender e escrever um texto. Para Perini (2013), tais competências precisam ser adquiridas na fase pré-escolar e continuar sendo desenvolvidas na e pela escola. A autora nos mostra que um dos pré-requisitos fundamentais para a apropriação da leitura-escrita pelo aprendente surdo é a constituição de uma “bagagem de conhecimentos e de conceitos”, isto é, o desenvolvimento conceitual. Além disso, o aprendente leitor-escritor surdo necessita construir as habilidades necessárias para tratar os dados adquiridos graças ao seu desenvolvimento conceitual, o que requer o desenvolvimento das funções executivas.

Perini (2013, p.31) explica que:

No que se refere à escrita, essas funções asseguram um conjunto de operações, como a emissão de hipóteses sobre o sentido de uma palavra, a seleção de conhecimentos gramaticais úteis para interpretar corretamente um enunciado ou ainda a dedução de informações implícitas do texto.

Desse modo, a fase pré-escolar deveria ser um momento privilegiado para a familiarização da criança surda com a escrita, através de situações que permitissem os primeiros contatos com a língua escrita (o manuseio de livros, por exemplo), e as primeiras tentativas de identificação e/ou reconhecimento das letras e dos símbolos gráficos (Perini, 2013).

 

Você não pode esquecer de que a criança surda “[...] não tem a possibilidade de ‘reconhecer’ nas palavras escritas, as palavras faladas em seu entorno” (Hamm, 2012, p. 106). Assim, a exposição precoce aos livros poderia levar a criança surda a tomar consciência do valor simbólico e social da escrita (Courtin, 2005). Para esse autor, trata-se já da “emergência do processo de alfabetização”, o que facilitaria a aprendizagem formal da leitura, quando a criança surda ingressar na escola, uma vez que ela já chegaria sabendo o que é a escrita e para que ela serve.

É essencial que você tenha em mente que o desenvolvimento prévio dessas competências durante a fase pré-escolar está intrinsecamente ligado à apropriação de uma primeira língua de sinais pela criança surda (a Libras, ou a língua de sinais da micro-comunidade surda à qual ela pertence ou uma Língua de Sinais Emergente).

Segundo Duhayer, Frumholz e Garcia (2006), nós não deveríamos ter dúvida de que a primeira condição para a apropriação da leitura-escrita pelos aprendentes surdos é o seu pleno desenvolvimento na sua primeira língua de sinais, pois é somente em língua de sinais que esses indivíduos são capazes de desenvolver normalmente e completamente suas competências cognitivas, sociais e psicológicas, sem as quais ninguém (surdo ou ouvinte) é capaz de compreender o que é uma língua e de se apropriar da leitura-escrita.

Ademais, segundo Niederberger e Prinz (2005), muitos autores defendem a hipótese de que transferências da primeira língua de sinais do aprendente leitor-escritor surdo para a língua escrita são possíveis, tanto no plano linguístico e/ou metalinguístico, quanto no plano cognitivo.

No que diz respeito às transferências linguísticas das línguas de sinais para a língua escrita, Padden e Ramsey (2000) sugerem que os sinais soletrados (aqueles formados pela representação ortográfica completa ou parcial de palavras de uma língua escrita por meio da datilologia – em Libras temos, por exemplo: A-Z-U-L; N-U-N-C-A; O-I; e V-A-I (Veja a figura 5), e os sinais inicializados (aqueles que iniciam com a datilologia da primeira letra correspondente às palavras de uma língua escrita – em Libras temos como exemplo: VERDE; MARROM, entre outros (Veja a figura 6), poderiam ser uma ponte entre a primeira língua de sinais do aprendente leitor-escritor surdo e a língua escrita.

Figura 5 - Sinais soletrados

Fonte: Pizzio, Rezende e Quadros (2009, p. 35).

Figura 6 - Sinais inicializados da Libras

Fonte: Pizzio, Rezende e Quadros (2009, p. 36).

Nessa mesma perspectiva, podemos acrescentar os sinais que retomam a forma dos sinais gráficos de uma língua escrita (em Libras temos como exemplo os sinais ASPAS, PONTO e INTERROGAÇÃO (Veja a figura 7). Em síntese, essas três categorias de sinal podem propiciar transferências lexicais da Libras para o português escrito.

Figura 7 – Sinais da Libras que retomam a forma dos sinais gráficos da língua portuguesa escrita

Fonte: Pizzio, Rezende e Quadros (2009, p. 36).

 

Os conhecimentos que os aprendentes surdos adquirem no nível discursivo (como a gramática das narrativas e a gestão de informação), em sua primeira língua de sinais podem ser, igualmente, transferidos para a língua escrita (Wilbur, 2000). As habilidades metalinguísticas que o aprendente leitor-escritor surdo desenvolve nas experiências linguísticas com sua primeira língua de sinais também podem possibilitar a realização de comparações entre esta e a língua escrita, em que ele é capaz de contrastar as diferenças e as semelhanças entre essas línguas (Mayberry; Lock, Kazmi, 2002).

Como você acabou de ver, a primeira língua de sinais do aprendente leitor-escritor surdo desempenha um papel crucial no seu desenvolvimento cognitivo e na aquisição do conhecimento prévio necessário para a construção de sentido no momento da leitura. Na próxima seção, você vai conhecer um pouco mais os processos cognitivos da leitura.

2.2 Os processos cognitivos de leitura

A partir dos anos 1970, a aprendizagem começa a ser explicada por modelos cognitivistas. A abordagem cognitivista aplicada ao ensino de segunda língua dá início a uma reflexão sobre os processos mentais implicados nas situações de aprendizagem e coloca em evidência o processo de tratamento da informação pelo aprendente leitor na busca do sentido de um texto. Outro aspecto importante que você precisa saber sobre os modelos cognitivistas é que eles estão centrados no aprendente, considerando-o como ator principal de sua aprendizagem.

A apropriação da leitura exige o desenvolvimento das habilidades de decodificar a palavra e de compreender o texto escrito. Trata-se de um processo ascendente que parte, progressivamente, da decodificação ou reconhecimento da palavra para chegar ao sentido do texto, passando pela aquisição, armazenamento e recuperação do significado da palavra; pela extração do sentido da frase, a partir das palavras e da estrutura sintática; pela percepção dos implícitos (isto é, daquilo que não está dito, mas subentendido) e postulação de inferências; para, finalmente, utilizar a estrutura do texto para organizar, armazenar e lembrar da informação.

Essas habilidades mobilizam os recursos da memória de trabalho do aprendente leitor. A memória de trabalho é a função cognitiva que possibilita o armazenamento e o processamento de informações ao realizar tarefas cognitivas complexas como a compreensão, a aprendizagem e o raciocínio (Baddeley; Logie, 1999). A memória de trabalho se divide em duas partes, uma destinada ao armazenamento das informações e a outra ao tratamento das informações (Baddeley; Hitch, 1974). Desse modo, se a parte da memória de trabalho responsável pelo armazenamento das informações ocupa muito espaço, o tratamento das informações fica prejudicado e vice-versa.

 

Mascarello (2018), por exemplo, adverte que o fato de uma criança decodificar as palavras, mas não as entender ou não lembrar do que leu pode ser um indicativo de que sua memória de trabalho está sobrecarregada e precisa ser melhorada.

Courtin (2002) explica que se o acesso à palavra é cômodo, o trabalho de reflexão sobre o texto se torna mais fácil, porque haverá mais espaço disponível na memória de trabalho. Por isso, é importante que você reflita sobre a questão da identificação das palavras pelo aprendente leitor surdo e conheça os modelos teóricos da leitura, a fim de pensar em alternativas para facilitar essa etapa da apropriação da leitura.

De uma maneira geral, os modelos teóricos da leitura preconizam o ensino da leitura pela via fonológica e sua indispensabilidade nesse processo, ou seja, necessariamente, por meio da decodificação grafofonêmica que parte da identificação dos grafemas para a sua conversão em fonemas. Roazzi (1999, p. 35) destaca que essa questão da imprescindibilidade da recodificação fonológica para a leitura é bastante antiga e ainda muito debatida.

Contudo, Perini (2013) alerta para o fato de que há surdos que se tornam bons leitores sem passar pela via fonológica e, por isso, defende que não há fundamentos para afirmar que é necessário conhecer a forma falada de uma língua para aprender a sua forma escrita. Nesta direção, surge a alternativa de adotarmos uma via logográfica (denominada também de direta ou visual) no ensino de leitura para o público surdo, em que a palavra é apreendida de uma maneira global por meio de um procedimento direto da letra para o significado.

Roazzi (1999, p. 35) explica que, na via lexical, “as pessoas reconhecem uma palavra como um padrão visual e aprendem uma correspondência direta entre as letras e a representação do significado sem haver necessariamente a intermediação de um código fonológico”. Assim, uma via lexical não exige do aprendente leitor surdo competências fônicas que ele não possui ou que ele possui parcialmente, mas as suas competências de aprendente visuoespacial.

 

Silverman (2005) descreve o aprendente visuoespacial a partir, entre outras, das seguintes características:

  1. competências visuais;
  2. pensar principalmente em imagem;
  3. ter uma memória visual prolongada;
  4. criar métodos únicos de organização;
  5. desenvolver suas próprias estratégias de resolução de problemas;
  6. aprender de maneira global;
  7. aprender por conceitos;
  8. apropriar-se dos conceitos do geral para o específico;
  9. aprender com mais facilidade as palavras na sua totalidade;
  10. visualizar as palavras antes de soletrá-las.

A seguir, você vai conhecer um pouco dos processos cognitivos envolvidos na escrita.

2.3 Os processos cognitivos da escrita

A maior parte dos estudos brasileiros sobre o ensino e o processo de apropriação da escrita pelos aprendentes surdos se resume a identificar e descrever os erros de sua produção sem, no entanto, apresentar hipóteses de solução e/ou indicar encaminhamentos didático-pedagógicos para fazer progredir suas aprendizagens.

Perini e Righini-Leroy (2008) lembram que as dificuldades do aprendente surdo na apropriação da escrita não estão, necessariamente, ligadas à surdez. As autoras argumentam que um dos fatores que pode explicar as dificuldades são os métodos utilizados para o ensino de escrita para o público surdo “que pressupõe um processo de aprendizagem idêntico entre surdos e ouvintes” (p. 81).

A escrita é cognitivamente diferente da leitura, trata-se de um processo descendente que parte do geral para a palavra isolada. Nesse processo, o aprendente escritor surdo precisa determinar a estrutura do texto que ele vai produzir, construir os parágrafos sobre os pontos principais do tema escolhido, construir frases gramaticais e ordená-las adequadamente, escolher o vocabulário adequado e, também, produzir uma escrita inteligível (Courtin, 2002). Em todas essas etapas, o aprendente escritor surdo precisa levar em consideração os conhecimentos do leitor, isto é, do público a que pode se destinar a sua produção.

 

A escrita exige, portanto, como pré-requisito um bom desenvolvimento sociocognitivo, isto é: “[...] a capacidade de compreender que o outro não compartilha dos mesmos pensamentos, conhecimentos, habilidades e gostos que nós, ou seja, a habilidade de se adaptar a seu interlocutor” (Perini, 2013, p. 31). Você deve guardar em sua mente que ler e escrever são atividades que pressupõem os pré-requisitos de reconhecer e exprimir conceitos pela escrita. Por isso, o aprendente leitor-escritor surdo precisa dispor desses conceitos antes de poder lê-los ou escrevê-los e você não pode esquecer de que sua aquisição se dá por meio das conversações diárias na primeira língua de sinais (Courtin, 2002).

A premissa básica para pensar as especificidades da apropriação da leitura-escrita pelos surdos é que, nesse processo, o aprendente leitor-escritor surdo precisa se apropriar da representação visuográfica (a escrita) da oralidade vocal (a fala) de uma língua (o português), a qual ele ou não tem acesso ou tem acesso parcial. De tal modo, ele se vê compelido a representar a única oralidade a qual ele tem pleno acesso (a visuogestual da Libras) por meio da representação visuográfica da língua portuguesa. Assim, nos estágios mais iniciais da apropriação da escrita, o aprendente escritor surdo vai “transcrever” a Libras utilizando os recursos gráficos da escrita em português. Isso tem caracterizado os estágios iniciais de sua interlíngua.

Na próxima seção, você poderá aprofundar um pouco mais seus conhecimentos acerca da apropriação da escrita pelo aprendente surdo, através da breve discussão que propusemos sobre a emergência das interlínguas do aprendente leitor-escritor surdo.

2.4 A emergência da interlíngua do aprendente surdo no processo de apropriação da escrita

Até aqui, nesse módulo, nós apresentamos algumas amostras de como se dá a produção escrita dos surdos e esperamos que você tenha percebido as singularidades desse processo (limitação do léxico, uso inadequado de verbos e preposições, omissão de conectivos, entre outras). Você precisa estar ciente de que essas singularidades caracterizam o nível de apropriação da língua portuguesa escrita em que o aprendente surdo se encontrava no momento da produção.

No campo do ensino-aprendizagem de línguas, os níveis de apropriação linguageira deram origem a noção de “interlíngua” (Selinker, 1972), isto é, uma língua intermediária entre a primeira língua e a língua-alvo (Pendanx 1998). Desse modo, no caso da interlíngua do aprendente surdo, estamos falando de uma língua intermediária entre a sua primeira língua de sinais e a Língua Portuguesa, caracterizada pelo uso que o aprendente surdo faz do português escrito no nível de apropriação em que ele se encontra. À medida em que o aprendente surdo vai progredindo no processo de apropriação do português escrito, sua interlíngua vai evoluindo e se aproximando mais dos usos correntes da língua-alvo, conforme ilustrado na figura abaixo.

Figura 8 - Emergência das interlínguas no processo de apropriação do português escrito pelos surdos

Fonte: Elaborado pelos autores

Contudo, na ausência de profissionais especializados, de modelos e métodos para a alfabetização e letramento de crianças surdas e de abordagens específicas para o ensino de português como segunda língua para surdos (PSLS), é muito comum que haja o fenômeno da fossilização (Selinker, 1972), isto é, o aprendente surdo vai manter na sua interlíngua elementos e regras da sua primeira língua de sinais.

Assim, surgem os “erros fossilizados” na sua produção escrita, aqueles erros que se tornam permanentes e estáveis e que tem caracterizado o texto dos aprendentes surdos, dentre os quais, os mais comuns são a conjugação inadequada dos verbos, o uso inadequado ou omissão de conectivos e a inadequação da ordem frasal.

Diante disso, você, professor, precisa estar ciente de que as singularidades da produção escrita dos aprendentes surdos, que, inadvertidamente, alguns autores insistem em denominar de “português de surdo” são, como você está vendo, apenas uma das línguas intermediárias do aprendente surdo no estágio de apropriação da língua portuguesa escrita em que ele se encontra. Uma vez que a progressão de suas aprendizagens seja garantida por meio de abordagens e materiais específicos para o ensino de Português como segunda língua para surdos e da Libras como língua de instrução, o aprendente surdo terá a possibilidade de desenvolver as competências necessárias para uma escrita mais fluente da língua portuguesa.

A noção de interlíngua deixa evidente o papel decisivo da primeira língua de sinais no processo de construção da segunda língua pelos aprendentes surdos.

Na prática:

Essa questão pode ser ilustrada com o exemplo dado pela professora Sueli Ramalho Segala, em sua participação no programa televisivo “Provocações”, em 2012, em que explica a diferença entre a estrutura das línguas de sinais e das línguas vocais.

Neste exemplo prático, Sueli utiliza a sentença “O gato comeu o rato” para explicar que a ordem canônica sujeito-verbo-objeto da língua portuguesa, nesse caso, não faz sentido para os surdos sinalizantes da Libras. A professora surda argumenta acerca da sintaxe espacial da Libras para mostrar que a estrutura da frase em Libras segue uma lógica visuoespacial. Assim, para que a informação expressa pela sentença “O gato comeu o rato” faça sentido em Libras, é necessário utilizar a ordem objeto-sujeito-verbo, como representado na figura abaixo.

Figura 9 - A estrutura frasal: português e libras

 

O exemplo acima não é um exemplo de interlíngua, mas nos permite visualizar uma das principais estratégias que o aprendente surdo lança mão no seu processo de apropriação da escrita em língua portuguesa, a de recorrer a sua primeira língua de sinais como referência para a sua produção escrita, bem como, nos possibilita elucidar um dos erros fossilizados mais comuns em sua escrita, a inadequação da ordem das palavras. Recorrer à primeira língua é um processo fundamental na apropriação de uma segunda língua, é a primeira língua que cria as condições para a apropriação da segunda (Giacobbe, 1990).

Besse e Porquier (1991) argumentam que a primeira língua é a “base linguageira”, bem como a “base cognitiva” do processo de apropriação da segunda língua.

Assim, podemos dizer que o aprendente surdo se apoia em sua primeira língua de sinais para se apropriar da leitura e da escrita em língua portuguesa. Por isso, parece-nos comum que, em estágios iniciais da apropriação da língua portuguesa escrita, o aprendente surdo realize uma tradução sistemática dos enunciados da Libras para o português escrito. Salles et al. (2004) já relatavam isso, argumentando que, há anos, em nosso país, a alfabetização de surdos em língua portuguesa reforça a fossilização de uma interlíngua que, de acordo com essas autoras “[...] apresenta a estrutura da língua de sinais com vocabulário de língua portuguesa” (p. 49).

Você já viu anteriormente, que os modelos cognitivistas da aprendizagem nos levam a considerar os surdos como aprendentes ativos na sua tentativa de apropriação da leitura e da escrita e que eles são os atores principais de sua aprendizagem. Mais um aspecto importante que você precisa conhecer na abordagem cognitivista é que a formulação de hipóteses é o processo cognitivo fundamental implicado na apropriação de uma segunda língua.

No caso dos aprendentes surdos, as hipóteses são feitas a partir do conhecimento que eles já construíram em Libras e sobre a Libras (ou em e sobre a sua primeira língua de sinais). Assim, podemos dizer que o aprendente escritor surdo elabora seus enunciados escritos com base em suas hipóteses sobre o funcionamento da língua portuguesa. Por isso, nesse processo é essencial o feedback do professor de Português como Segunda Língua para Surdos (PSLS) no que concerne à validade de suas hipóteses. Nessa perspectiva, o erro é considerado como uma testagem de hipóteses, como no exemplo da figura abaixo:

Figura 10 – Comentários avaliativos sobre a produção escrita de um aprendente escritor surdo

Fonte: Dias e Barbosa (2020, p. 15)

 

Observe que, nos primeiro e segundo parágrafos, o aprendente escritor surdo testou sua hipótese acerca do uso da preposição com:

  1. “Os homens não ter amor pelas com a mulher e eles matam.”;
  2. “Tem muita falta de respeito com a mulher.”;
  3. “Os homens que matam as mulheres todos os dias, não tem amor com e a mulher sofre a mulher tem medo sempre.”

No caso da prática de ensino de Português relatada por Dias e Barbosa (2020), cujo exemplo você viu acima, houve um momento para a análise e tratamento dos erros identificados na produção do aprendente escritor surdo, em que a professora apresentou um feedback de sua produção escrita por meio de comentários avaliativos e sugestões. Dessa forma, o aprendente escritor surdo teve a oportunidade de saber que as hipóteses de uso da preposição com que ele formulou não eram aceitáveis, pois não foram validadas pela professora. Para nós, a ausência de análise e tratamento dos erros dos aprendentes leitores-escritores surdo pelos professores ao longo das aulas se constitui como uma das causas principais do fenômeno de fossilização.

Para concluir, depois de tudo o que foi mostrado neste capítulo, esperamos que você tenha compreendido que o obstáculo maior à progressão das aprendizagens do aprendente surdo no processo de apropriação da leitura-escrita em língua portuguesa não é a surdez, mas a carência de formação especializada para o ensino de Português como segunda língua para surdos, a falta de clareza epistemológica e didático-pedagógica acerca do ensino-aprendizagem de Português e a precariedade de materiais didáticos com fundamentação didático-metodológica para o ensino da segunda língua nos processos de alfabetização e letramento de crianças surdas.

3. Alfabetização de crianças surdas

Agora que você compreendeu o que é alfabetização e letramento, e conheceu as especificidades relacionadas ao processo de apropriação da leitura e escrita por sujeitos surdos, vamos entender um pouco mais como ocorre a incursão inicial da criança surda no mundo da escrita.

Como sabemos, o aluno surdo aprende a escrita de um sistema alfabético, o qual busca representar o Português oral e a sua forma de organização da língua. Nesse sentido, as crianças aprendem a escrever uma segunda língua de uma segunda modalidade, isto é, eles precisam se apropriar de um sistema de escrita de uma modalidade oral/auditiva.

Por muito tempo, acreditou-se que para escrever bem era preciso falar. Por conta disso, é comum encontrarmos pessoas surdas que compartilham desse pensamento e afirmam que os ouvintes escrevem bem por serem falantes do Português como primeira língua. Isso não é uma verdade. A escrita não é um processo natural para nenhuma pessoa, seja ela surda ou ouvinte.

Aprender a ler e escrever exige outros processos que vão além da fonetização, trata-se de uma ação mental, cognitiva, motora e também sensorial. Sendo assim, qualquer criança que inicie a alfabetização precisa compreender a lógica desse processo, entender a funcionalidade da escrita em nosso cotidiano e a capacidade humana para simbolizar e representar o mundo por meio das palavras. No entanto, há uma condição primordial para que a criança seja consciente de todo esse desenvolvimento: a aquisição da primeira língua.

 

Você lembra o que estudamos no módulo anterior? Toda aquela discussão inicial sobre a aquisição da língua de sinais das crianças surdas é para que você compreenda a importância da língua de sinais na alfabetização das crianças surdas, pois é através dessa língua que elas interagem com seus pares, acessam informações, se constituem como sujeitos, constroem seu conhecimento enciclopédico e bases conceituais para aprender a segunda língua.

Segundo Peixoto (2006) a língua de sinais assume “papel semelhante ao que a oralidade desempenha quando se trata de apropriação da escrita pelo ouvinte”. Isso significa que esse processo de apropriação está diretamente relacionado ao conhecimento que a criança traz em língua de sinais, pois é através dessa língua que o surdo irá interpretar, compreender e buscar apoio para os primeiros registros escritos na segunda língua, da mesma forma que o aluno ouvinte faz com o Português oral.

3.1 O processo inicial de apropriação da escrita por crianças surdas

Como você já deve ter observado, o processo de apropriação da escrita por crianças surdas difere das crianças ouvintes, especialmente em razão das línguas envolvidas. Para exemplificar algumas singularidades que podem ser observadas ao longo do desenvolvimento da escrita da criança surda, apresentamos um estudo realizado por Renata Peixoto, com 15 crianças surdas, de 4 a 11 anos de idade, matriculadas entre a educação infantil e o 2º ano do Ensino Fundamental de uma escola bilíngue de Recife. Peixoto (2006) identificou as características elencadas abaixo (figura 11) com destaque para o uso dos parâmetros fonológicos da língua de sinais e a representação dos aspectos viso-espaciais na organização da escrita.

Figura 11 - Características do processo inicial de apropriação do Português como segunda língua por crianças surdas

Fonte: Elaborado pelos autores

 

1. Desenho: assim como as crianças ouvintes, em um primeiro momento, os surdos também utilizam o desenho para representar a realidade. É uma etapa onde ainda não há um domínio do sistema alfabético e um entendimento pleno acerca da escrita como forma de representação da língua. De acordo com Peixoto (2006), o desenho é uma forma confortável para os escritores iniciantes porque possibilita o registro daquilo que, pela escrita, ainda não conseguem transmitir.

Figura 12 - Desenho

Fonte: Peixoto (2006, p. 2017)

 

2. Representação do sinal por meio de desenho: uma das características bem peculiares em relação às primeiras produções escritas das crianças surdas foi o registro visual do sinal (desenho). Peixoto (2006) destaca que essa é uma estratégia exclusiva dos surdos, em razão da modalidade visual/espacial da língua de sinais, a qual permite a representação figurativa da sua língua. Esses dados demonstram que as crianças surdas começam a transformar a escrita em uma representação da linguagem, passo fundamental para o processo de apropriação do Português escrito.

Figura 13 - Escrita com o desenho do sinal de A.D. e M.J., alfabetização

Fonte: Peixoto (2006, p. 218)

 

3. Representação da configuração de mão: uma outra característica específica das crianças surdas em processo de alfabetização é a representação da configuração de mão nas produções escritas. Esses dados são fundamentais porque comprovam a relação intrínseca entre a língua de sinais e o processo de apropriação do Português escrito pelos surdos. Dessa forma, é possível perceber que assim como os ouvintes são influenciados pelo Português oral - sua primeira língua - as crianças surdas também buscam referência em sua L1 para realizar seus primeiros registros.

A configuração de mão é um dos parâmetros que formam o sinal e se refere à forma como a mão é posicionada para a produção do sinal. Em Língua Brasileira de Sinais, temos 79 configurações de mãos, conforme observado na imagem abaixo:

Na figura 14, podemos observar um exemplo de como as crianças registram a configuração de mão dos sinais na escrita do Português. Por exemplo, o sinal de “memória” é realizado com a configuração de mão em “M” e as crianças iniciam a palavra com M, o que está de acordo com a palavra em Português. O segundo exemplo representa a tentativa de escrita da palavra “MAU” e, como você pode observar, as crianças iniciaram a palavra com a letra B. Você saberia explicar o porquê dessa escolha? Assim como no primeiro caso, a criança se apoia na configuração de mão do sinal - nesse caso é com a mão em “B” - e utiliza na escrita da palavra.

Figura 14 - Representação da escrita conforme a configuração de mão

Fonte: adaptado de Peixoto (2006, p. 223)

4. Representação do movimento do sinal: um outro parâmetro da Língua Brasileira de Sinais é o movimento, o qual se refere à forma como as mãos se movimentam na produção do sinal. Peixoto (2006) traz mais uma particularidade no registro das crianças surdas, o qual também ratifica a relação intrínseca com a língua de sinais. Diante da apresentação do sinal “Iguatemi” - desconhecido para as crianças - houve uma representação da configuração do sinal em “I” juntamente com um registro do movimento das mãos, o qual a pesquisadora chamou de “tamborilar dos dedos”.

Figura 15 - Representação da escrita conforme o movimento do sinal

Fonte: Peixoto (2006, p.225)

5. Representação do tipo de sinal: além da relação com a configuração de mão, é possível observar também a influência do tipo de sinal (simples - composto) na produção escrita do aluno surdo. Peixoto (2006) mostra que as crianças usaram duas palavras para se referir ao sinal de “consertar”, cuja produção em língua de sinais é feita por dois sinais.

Figura 16 - Produções escritas a partir de sinais compostos

Fonte: Peixoto (2006, p. 222)

Quando falamos em alfabetização de crianças surdas, sempre destacamos o papel da língua de sinais nesse processo. Você já tinha visto como essa relação acontece?

Socialize!

Você já trabalhou com alfabetização de crianças surdas? Ou já acompanhou, de alguma forma, esse processo?

Se já teve essa vivência, compartilhe conosco a sua experiência.

Se ainda não teve essa experiência, conte para nós quais são os maiores desafios que você percebe neste processo.

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As especificidades identificadas nos estudos de Peixoto (2006) comprovam o papel da língua de sinais na apropriação do Português escrito e mostram que é possível desenvolver a escrita sem passar pela fonetização, sem que o ponto de partida seja a oralidade. Mesmo para um ouvinte falante do Português como primeira língua, percebemos desafios na alfabetização, já que para aprender a escrever não basta considerar somente a oralidade, mas compreender que a representação escrita é um processo complexo e abstrato.

Você deve estar se perguntando sobre a relação dos surdos com as palavras, haja vista a inexistência da relação entre letra e som. Como você viu, em um primeiro momento, há influência da língua de sinais no processo de apropriação da escrita para, em seguida, evoluir para uma representação do Português. Entretanto, diferente dos ouvintes, os surdos processam as palavras como um todo, as reconhecem em sua forma ortográfica para assim compor o seu repertório lexical. É muito comum, inclusive entre jovens e adultos surdos, observarmos esse processo quando diante de algumas palavras desconhecidas remetem a outras palavras familiares. Por exemplo:

Você viu os exemplos acima? Percebeu que algumas partes da palavra estão em destaque? Aquelas partes grifadas são formas de ilustrar como os surdos lêem alguns vocábulos desconhecidos. É normal que eles busquem em seu repertório lexical palavras que já conhecem e, nessa ação, atribuam significados a partes da palavra que lhes são familiares.

Por exemplo: ao ver a palavra CASAMENTO, o aluno realiza o sinal de CASA (residência), por já conhecer a palavra CASA. Em casos assim, o professor precisa fazer a mediação e explicar que ali temos uma nova palavra, seu sinal e contextos de uso.

Almeida (2000 apud Pereira, 2009, p.24 ) também identificou tentativas de um sujeito surdo ao conferir significados a algumas palavras, conforme mostra o exemplo abaixo:

 

Exemplos de um surdo conferindo significado às palavras

Nas palavras “cara” e “fazendo”, ele perguntou se era igual a “caro” e “fazenda”, em “identidade”, fez o sinal de “RG” e diante da palavra "expressão", soletrou e fez sinal de pressão, pensou que se referisse a caminhão por ser pesado e fez sinal de ex-namorada.

Finalmente, para “significado” perguntou se era igual a signo.

Estes exemplos revelam um movimento do sujeito de buscar no seu conhecimento prévio pistas que o ajudem a atribuir sentido às palavras lidas. Na tentativa de atribuir significado à palavra “expressão” o sujeito parece fazer uma análise da palavra, dividindo em “ex” e “pressão” e vai buscar em seu conhecimento prévio um contexto em que estas palavras façam sentido.

Fonte: adaptado de Pereira (2009)

Lembra da discussão anterior acerca dos processos cognitivos da leitura pela via fonológica e pela via lexical? Como você estudou, esse processo de reconhecimento da palavra como um todo é denominado via/rota lexical, sendo uma das formas de leitura. Na rota lexical acontece um processamento visual direto de palavras que já foram lidas e, por isso, são reconhecidas. Diferente da rota fonológica, onde as palavras são identificadas a partir da sua estrutura sonora por meio de uma relação entre os sons e os grafemas, na rota lexical há um reconhecimento visual da palavra.

A partir do exemplo citado por Fernandes (2006, p.9), você pode experienciar como se dá a leitura a partir da rota lexical.

Conseguiu compreender o texto? Foi possível reconhecer as palavras mesmo com as letras invertidas? Acreditamos que sim. É assim que se dá a identificação da palavra com base na rota lexical, a qual é cada vez mais utilizada por pessoas fluentes de uma língua. Para os surdos, é assim que acontece a leitura do Português, já que a língua escrita é percebida visualmente, ou seja, a palavra é vista como um todo.

No caso dos surdos, a leitura não ocorrerá recorrendo às relações letra-som (rota fonológica). Desde os primeiros contatos com a escrita, as palavras serão processadas mentalmente como um todo, sendo reconhecidas em sua forma ortográfica (denominada rota lexical), serão “fotografadas” e memorizadas no dicionário mental se a elas corresponder alguma significação.

(FERNANDES, 2006, p. 9)

Como você pode ver na citação acima, a autora ressalta que as palavras serão inseridas no dicionário mental se “a elas corresponder alguma significação”, por esse motivo é tão importante que a alfabetização ocorra de maneira contextualizada, significativa e de maneira visual.

3.2. As práticas de alfabetização de crianças surdas

Atualmente, os maiores desafios para proporcionar práticas coerentes com a realidade dos estudantes surdos estão relacionados à formação de profissionais capacitados e que conheçam as várias singularidades envolvidas no processo de apropriação da escrita desses sujeitos. Fernandes (2006) destaca algumas atividades adotadas na alfabetização de crianças ouvintes e como elas seriam inviabilizadas nas aulas com sujeitos surdos. Observe a seguir:

Quadro 4: Alfabetização de crianças ouvintes e surdas

Práticas adotadas na alfabetização com crianças ouvintes Implicações para a aprendizagem de alunos surdos
Parte-se do conhecimento prévio da criança sobre a língua portuguesa, explorando-se a oralidade: narrativas, piadas, parlendas, trava-línguas, rimas. Não há conhecimento prévio internalizado; a criança não estrutura narrativas orais e desconhece o universo folclórico da oralidade.
O alfabeto é introduzido relacionando-se letras a palavras do universo da criança: nomes, objetos da sala de aula, brinquedos, frutas, etc.
Ex: A da abelha, B da bola, O do ovo…
Impossibilidade de estabelecer relações letra x som; a criança desconhece o léxico (vocabulário) da língua portuguesa, já que no ambiente familiar sua comunicação restringe-se a gestos naturais ou caseiros (na ausência da língua de sinais).
As sílabas iniciais ou finais das palavras são destacadas para a constituição da consciência fonológica e percepção que a palavra tem uma reorganização interna (letras e sílabas). A percepção de sílabas não ocorre já que a palavra é percebida por suas propriedades visuais (ortográficas) e não auditivas.
A leitura se processa de forma linear e sintética (da parte para o todo); ao pronunciar sequências silábicas a criança busca a relação entre as imagens acústicas internalizadas e a unidades de significado (palavras). A leitura se processa de forma simultânea e analítica (do todo para o todo); a palavra é vista como uma unidade compacta; na ausência de imagens acústicas que lhes confiram significados, as palavras são memorizadas mecanicamente, sem sentido.
Fonte: Fernandes (2006, p. 6)

 

Muitas das práticas pedagógicas elencadas acima e desenvolvidas com as crianças ouvintes, pautadas na sonoridade da língua, são aplicadas inadequadamente também com as crianças surdas. Dentre os problemas apontados pela autora, podemos destacar o conhecimento prévio e a relação entre som e escrita que é predominante na alfabetização de crianças surdas.

Ao longo do primeiro módulo, enfatizamos a importância da interação com pares surdos, das experiências compartilhadas em língua de sinais, da Literatura Surda e isso tem relação direta com a construção do conhecimento enciclopédico, da base que será explorada no processo de alfabetização. Desse modo, o professor parte do universo cultural e linguístico dos surdos e não de textos orais, de práticas que não contemplam as crianças surdas.

Um exemplo é o trabalho realizado com o alfabeto em sala de aula e a relação com imagens correspondentes: A de Abelha, B de Bola, C de Carro. Essa relação é estritamente construída por causa da fala e acontece diariamente no ensino de Português como língua materna para ouvintes, mas não contempla de forma plena os surdos.

Uma possibilidade, no caso dos surdos, é partir da configuração de mão para explorar a criação de sinais, como no exemplo abaixo, onde a configuração de mão apresentada é usada em vários sinais da Libras:

Além da necessidade de ter a língua de sinais na base da prática com a escrita, o ensino do Português como segunda língua envolve o trabalho com a função social, gramatical e lexical.

Aspectos funcionais: todo texto presta-se a uma função social (dirige-se a alguém, com uma intenção); seu sentido só pode ser apreendido se articulado à prática social que lhe deu origem, ao veículo no qual ele se apresenta (jornal, revista, outdoor, embalagem de um produto, etc.) e às intenções que revela (vender algo, informar sobre, questionar, fazer refletir, etc.).

Aspectos lexicais: as palavras só adquirem significado no contexto em que são veiculadas; as crianças surdas, em sua maioria, desconhecem mesmo o significado literal das palavras, quanto mais seu caráter polissêmico; portanto, há a necessidade de sistematização do vocabulário (léxico) implicado no texto e sua intertextualidade com leituras anteriores.

Aspectos gramaticais: aprender uma língua envolve conhecer sua gramática, ou seja, as regras de sua organização, as leis que permitem que seus usuários se entendam entre si; essas regras não são externas ao texto, mas são constituídas internamente. O que está em foco não é a gramática tradicional e suas regras e nomenclaturas, mas as regras que nos permitem construir enunciados compreensíveis na língua, independente de estarem ou não na norma padrão. Cada texto será um instrumento de investigação para a descoberta do funcionamento da língua portuguesa (Fernandes, 2006, p. 14)

Os aspectos mencionados por Fernandes (2006) possuem relação com as competências necessárias para que o aluno desenvolva a competência comunicativa.

E você sabe o que é competência comunicativa? Quando aprendemos uma língua, temos qual objetivo? Simplesmente aprender regras gramaticais e conhecer novas palavras? Não. O intuito é comunicar-se, é saber utilizar a língua nos mais variados contextos e situações específicas de comunicação, seja para fazer um pedido, enviar um e-mail, interagir com os amigos nas redes sociais, comprar um lanche, fazer uma reclamação, dentre várias outras circunstâncias.

Nesse sentido, o ensino de Português como segunda língua para surdos desde os anos iniciais deve ter como propósito o desenvolvimento da competência comunicativa, da capacidade desses sujeitos para produzir e compreender os mais variados tipos de textos de acordo com o contexto comunicativo. Para isso, é preciso mobilizar os conhecimentos relacionados à competência linguística, sociolinguística e pragmática.

 

As competências linguística, sociolinguística e pragmática são fundamentais para que o aluno consiga desenvolver a competência comunicativa. No entanto, o que se espera é que o ensino do Português não se limite, por exemplo, aos aspectos ligados à competência linguística. Observe a atividade abaixo:

Figura 17 - Exemplo de atividade

Fonte: Canva

Você consegue perceber o objetivo da atividade acima? Se trabalharmos somente com ela, exploraremos o léxico, o conhecimento de novas palavras. Também é possível trabalhar com questões de semântica, por conta da relação de significado entre as palavras. Entretanto, qual a relação com o uso social da língua? Em quais situações comunicativas podemos utilizar o conhecimento adquirido? Quando preconizamos o desenvolvimento da competência comunicativa precisamos pensar em práticas contextualizadas, promover o trabalho com textos autênticos e assim favorecer o letramento das crianças surdas.

Considerando que os surdos utilizam uma língua visual para conceituar o mundo e construir sua própria identidade, é comum ouvir que as práticas pedagógicas pensadas com crianças surdas devem ser visuais. Porém, o que realmente significa a visualidade na alfabetização e no letramento de crianças surdas?

Uma das autoras que discute o letramento visual é Lebedeff (2010). Para a autora é imprescindível que nós exploremos todo o potencial da visualidade a partir da interpretação das imagens que estão ao nosso redor com o detalhe que estas, devem ser escolhidas com uma finalidade pedagógica. Veja a seguir uma contribuição da autora:

Discutir então letramento para a surdez requer pensar em práticas culturais e sociais: pensar em como os surdos leem e interpretam o mundo a partir de suas singularidades linguísticas e culturais; pensar em como os surdos utilizam social e culturalmente a língua escrita. Por exemplo, pesquisas demonstram que as singularidades da surdez estão para além da língua, os surdos utilizam estratégias diferentes das dos ouvintes para o ensino de língua escrita e para o conto de histórias (LEBEDEFF, 2010, p. 179).

Sendo assim, podemos entender o letramento visual como a capacidade de compreender, interpretar e criar mensagens visuais de maneira crítica. Isso envolve a habilidade de compreender elementos visuais, como imagens, gráficos, vídeos, cores e formas, assim como o letramento comumente utilizado nas escolas envolve a habilidade de compreender e produzir o texto escrito nos mais variados contextos.

É preciso ressaltar que mesmo o letramento dito “não visual” tem como característica de alguns de seus gêneros a utilização de imagens como a charge e as histórias em quadrinhos, por exemplo.

Bom, é bastante comum pensar que elaborar um material com uma sequência de imagens é suficiente para explicar conceitos aos alunos surdos por si só, pela sua sensibilidade visual. No entanto, é preciso aprender a interpretar tais imagens e desenvolver estratégias de interpretação também nos alunos, a fim de evitar que as imagens sejam apenas um ornamento no texto escrito.

Para além das figuras, podemos apresentar os conceitos principais a serem trabalhados em formatos diferentes, brincando com a disposição das palavras ao criar imagens com elas.

Em uma interessante pesquisa realizada com professores surdos, Lebedeff (2010) explorou o uso de mapas com diferentes estruturas para a organização de conceitos e ideias. A autora identificou que ao elaborar os gráficos propostos, os professores surdos participantes sempre traziam aspectos da história, da cultura e da língua dos surdos para mesclar aos conceitos chave abordados. Durante as oficinas a autora quis desenvolver a compreensão do letramento visual como uma possibilidade de reorganizar o texto “através de estratégias visuais para que possa ser mais bem compreendido” (Lebedeff, 2010, p. 184).

Como forma de estruturar os textos escritos, Lebedeff (2010) propôs a utilização dos seguintes tipos de organização visual para tratar de diferentes assuntos presentes no cotidiano dos alunos de maneira relacionada aos conteúdos a serem estudados:

  1. gráfico em árvore: é uma representação visual que exibe a estrutura hierárquica entre os tópicos do assunto a ser discutido. O tópico principal é o tronco da árvore e os demais são as suas ramificações.
  2. gráfico em teia: também é conhecido como brainstorm, mapa conceitual, ou mapa mental. Com ele é possível visualizar as relações entre diferentes conceitos ou ideias de maneira não linear.
  3. tabela: são uma forma eficiente de apresentar dados de maneira organizada e facilitam a busca, comparação e análise de informações.
  4. mapa de história: foi utilizado pela autora com a intenção de organizar as ideias para compor ou analisar uma história. São exemplos de elementos: cenário, hora, local, personagens, problema, “o que aconteceu” (desenvolvimento) e conclusão.
  5. histórias em quadrinhos: são uma forma de expressão que combina texto e imagens para contar uma história. Possui balões de diálogo, usa onomatopeias, narrativas visuais, ou seja, apenas imagens para contar uma sequência de acontecimentos (Lebedeff, 2010).

Você pode ver diferentes exemplos de estratégias visuais no material deste curso! Usamos imagens para exemplificar o recorte de um contexto da vida real, tabelas, mapas, gráficos, entre outros. É importante lembrar que as imagens por si só não são suficientes para ocorrer a aprendizagem: nós professores, como sujeitos mais experientes, devemos oferecer os subsídios que as crianças precisam para construir conhecimento com base nos saberes científicos.

Considerações Finais

O Módulo 2 termina aqui! Neste módulo você estudou sobre a indissociabilidade entre alfabetização e letramento, sobre alfabetizar letrando e as implicações desses conceitos no processo de aprendizagem da leitura e da escrita.

Também estudou sobre como acontece o processo de desenvolvimento da leitura e da escrita por sujeitos surdos e conheceu algumas práticas pedagógicas que podem ser utilizadas no processo de alfabetização e letramento das crianças surdas.

Esperamos que você tenha compreendido sobre este processo e sobre as diferenças na apropriação da leitura e da escrita pelas crianças surdas e ouvintes.

Até o próximo Módulo!

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Alfabetização e letramento de crianças surdas

[ Conteúdo ]

Aline Miguel da Silva dos Santos

Bruna Crescêncio Neves

Eder Barbosa Cruz

Fabíola Sucupira Ferreira Sell

[novembro 2023]

[ Design instrucional ]

Caroline Lengert

[ Design gráfico ]

Daniel Mazon da Silva

Jennifer Patricio Candido

[ Equipe de Tradução ]

[ Tradutor de Libras Surdo ]

Claudio Souza Brito

Gabriel Finamore de Oliveira

Paulo Ricardo Campos

Simone Gonçalves de Lima da Silva

[ Equipe de Tradução ]

[ Intérprete de Libras ]

Giliard Bronner Kelm

Karen Fernanda Bianchini da Silva

Saionara Figueiredo Santos

Tatiane da Silva Campos [coordenadora]

[ Edição de Vídeo ]

Danilo Adalberto Benedikt

Como referenciar este livro:

SANTOS, Aline Miguel da Silva dos; NEVES, Bruna Crescêncio; CRUZ, Eder Barbosa; SELL, Fabíola Sucupira Ferreira. Alfabetização e letramento de crianças surdas. 2023. Disponível em: https://moodle.ifsc.edu.br/mod/book/view.php?id=129978. Acesso em: 15 dez. 2023. [material digital]. 

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