5.3 Pedagogia Visual

A constituição de uma Pedagogia Visual representa as questões relativas aos processos de compreensão e interpretação do mundo pelo surdo por meio da experiência visual. Significa pensar a visualidade como marcador cultural da comunidade surda. Ainda que os surdos sejam diferentes entre si, existem alguns traços recorrentes e marcadores de identidade. Dentre esses traços, destacamos a experiência do olhar.

O olhar para o surdo, muito mais do que sentido, é uma possibilidade de ser outra coisa e de ocupar outra posição na rede social. O olhar, entendido como um marcador surdo, é o que lhe permite contemplar um modo de vida de diferentes formas, o cuidado uns sobre os outros, o interesse por coisas particulares ou interpretar e ser de outra forma depois da experiência surda. Enfim, o olhar como uma marca, é o que permite a construção de uma alteridade surda (Lopes; Veiga-Neto, 2006, p.90).

De acordo com Martins (2010, p.39) para desenvolver uma pedagogia visual, o professor precisa ser capaz de “transformar as palavras, as frases, as significações, os signos em outros signos visuais, ou seja, em “palavras visuais”, em imagem, porque isso facilita para os surdos.”

Um dos recursos artísticos e poéticos que adota essa prática de transformar palavras em imagens é o Visual Vernacular (ou VV), um novo estilo de expressão artística desenvolvido e representado por pessoas surdas. É um estilo baseado no uso de classificadores, expressões faciais e técnica de incorporação, que leva à criação de um ritmo, em um formato estético, performático e narrativo. Vem sendo utilizado principalmente na literatura surda, mas pode ser usado também no teatro e na música.

Segundo Mourão e Branco (2020, p.5) “ a performance da língua de sinais é necessariamente ligada à presença corporal em tempo real, à receptividade estética e à produção de significações, ligadas à emoção estética”, e isso se destaca dentro da literatura surda.

Um exemplo de Visual Vernacular é o vídeo Caterpillar. No vídeo, o ator utiliza a comunicação visual, com expressões faciais, movimento e velocidade, além de diversos classificadores, tais como: árvore crescendo, patas, antenas, asas da borboleta, para narrar uma história em Libras.

Podemos observar, na imagem abaixo, uma das cenas do vídeo:

Figura 10 - Cena do vídeo Caterpillar

 

Nesta cena o ator forma com as mãos e braços uma asa. Em seguida, olha para uma das asas e para a outra, e sorri. Então, o ator muda de cor e os movimentos ficam mais rápidos, demonstrando a alegria da borboleta em voar. Ao utilizar as mãos e os braços, incorpora a borboleta voando.

O Visual Vernacular pode auxiliar em diversas temáticas em sala de aula, pois trabalha com a visualidade da língua, com a imaginação, com as formas de contar e produzir literatura surda.

A ideia principal é explorar a imagética do Visual Vernacular e a iconicidade dos sinais através de seus classificadores e dos aspectos visuais e linguísticos específicos das línguas de sinais como: o movimento, a velocidade e a expressão facial.

Ao trabalhar a Pedagogia visual na escola, é fundamental usar todos os recursos visuais disponíveis, tais como a língua de sinais, CDs e DVDs, filmes legendados ou sinalizados, mapa de conceitos, gráficos, esquemas, e, principalmente, garantir que tais materiais sejam produzidos pela própria comunidade surda.

Através da utilização de bons recursos didáticos visuais, amplia-se a possibilidade de os alunos surdos se identificarem e desenvolverem a auto estima, a imaginação, a confiança, o controle, a criatividade, a cooperação, o senso de percepção e o relacionamento interpessoal. Uma das características fundamentais do recurso didático é funcionar como veículo estimulador do desenvolvimento humano, agindo de forma global e integrada nesse processo (Correia; Neves, 2019, p.10).

Saiba mais!

No site do Departamento de Educação Básica (DEBASI) do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) você encontra diversas opções de recursos visuais, atividades diversas, materiais didáticos e de apoio pedagógico.

Materiais para crianças e adolescentes


Recomendamos que você conheça os vídeos que tratam da “História das coisas”. É uma série de vídeos dinâmicos que contam a história das coisas que fazem parte da nossa vida e podem ajudar você a pensar ideias para o seu planejamento pedagógico. A apresentação dos vídeos é de Fabíola Saudan.

A história das coisas


Conheça também o Projeto Artegestoação, coordenado pelos professores Lúcia Vignoli e Tiago Ribeiro, que propõe práticas e ações pedagógicas transdisciplinares em educação de surdos, na interface com a linguagem artística além de outras linguagens e áreas do conhecimento.

O projeto trabalha com a ideia de transbordar fronteiras disciplinares e práticas curriculares como movimento pedagógico necessário na tessitura de uma pedagogia visual em educação bilíngue de surdos.

Projeto Artegestoação


Outra ideia interessante é o projeto Escritas da arte, coordenado pelas professoras Lúcia Vignoli e Lívia Buscácio, que conta com a participação de aprendizes-artistas surdos da educação básica do INES.

Durante o período de isolamento da pandemia de COVID-19, o grupo desenvolveu os Cadernos Cartoneros, uma ação conjunta entre os participantes do projeto, o Núcleo de Artes do CAP-INES e o professor Tiago Ribeiro. A proposta envolveu o trabalho com linguagens e a escrita de si, integrado com as artes visuais, palavras e poesia para e com a comunidade surda.

Projeto Escritas da arte